Especialista explica o elo entre a infecção por coronavírus e a SFC, síndrome que causa cansaço físico, dores e até perda de memória


A Síndrome de Fadiga Crônica (SFC) é uma condição cujo principal sintoma é a presença de fadiga que piora com atividade física e ou mental, mas não melhora com o repouso. Ela persiste por um período maior que seis meses, segundo a Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR). Diversos estudos realizados em instituições de saúde diferentes pelo mundo apontam a presença de fadiga como um sintoma preponderante de Covid-19.

Tanto na fase aguda quanto na fase de convalescência. A incidência varia de 70 a 90% no período agudo, associada ao quadro febril, e de 37 a 53% no período de convalescência. Em um estudo observacional chinês, a fadiga persistiu por mais de 60 dias após a cura.

Especialistas ressaltam que ainda é cedo para tirar todas as conclusões sobre a doença. “A fadiga pode ser intensa para quem teve o diagnóstico positivo para a Covid-19, mas convém separar do conceito de síndrome de fadiga crônica. Tendo em vista que a maioria dos pacientes ainda não alcançou o período de seis meses de cura clínica/laboratorial para serem classificados como tal”, diz a reumatologista Selma Merenlender, diretora técnica do Centro Multidisciplinar Fluminense e ex-presidente da Sociedade de Reumatologia do Rio de Janeiro (SRRJ).

Cerca de 8% dos pacientes acometidos por uma infecção viral estão propensos a desenvolver a síndrome, também chamada de neuromielite miálgica. A condição se caracteriza por sintomas como cansaço, dores musculares e articulares, febre baixa e perda de memória. E vem sendo identificada após um quadro infeccioso grave provocado pelo novo coronavírus, principalmente em pacientes que foram hospitalizados e tiveram comprometimento no coração.

Algumas linhas de pesquisas apontam que os sintomas neurológicos são causados por uma reação do próprio corpo em resposta à covid-19, criando um gatilho para desencadear processos inflamatórios reativos.

A síndrome se manifesta especialmente entre os 20 e os 50 anos. Embora afete mais as mulheres, não poupa homens e crianças, quaisquer que sejam suas idades. Níveis altos de estresse podem funcionar como gatilho para o surgimento das crises.

Encefalomielite Miálgica (ME), Doença da Disfunção Imune, Síndrome de Intolerância à Atividade Física, ou, simplesmente, Síndrome da Fadiga Crônica –, a condição somente foi reconhecida pelo Centro para Controle de Doenças dos Estados Unidos e a constar do CID 10 no final dos anos 1980. Foi a partir dessa data, que deixou de ser vista como “coisa da sua cabeça”, um distúrbio meramente psicológico, para ser definida como um transtorno que pode apresentar alterações em vários sistemas do organismo (neurológico, imunológico e endócrino).

É comum àqueles que têm síndrome da fadiga crônica serem rotulados de preguiçosos, indolentes, comodistas, avessos à ideia de trabalho. Cercados pelo preconceito, em geral, não encontram respaldo nem na comunidade médica, haja vista que grande parte dos especialistas atribui os sintomas a causas meramente psicológicas, emocionais ou à agitação da vida moderna. Daí a importância de divulgar e discutir as particularidades dessa doença que afeta o sistema motor como um todo e provoca um mal-estar pós-esforço marcado por fadiga física e mental debilitante.

No filme/documentário “Unrest” (Sem descanso, em tradução livre), com base na evolução da própria moléstia, a diretora Jennifer Brea traça um perfil que ajuda a entender essa condição. Destaca também a importância de encontrar on-line pacientes que compartilhem experiências semelhantes e características da evolução da doença.

Ainda não se conhece a cura para a síndrome da fadiga crônica. Até o momento, o objetivo do tratamento (necessariamente multidisciplinar) se volta para o alívio dos sintomas e o controle das doenças que podem contribuir para a gravidade do quadro.

Em linhas gerais, ele se baseia num programa gradual de exercícios físicos, aeróbicos e de força, e na aplicação da terapia cognitivo-comportamental, visando a mudanças de estilo de vida.

Nenhuma droga provou, ainda, sua eficácia no tratamento da síndrome. No entanto, medicamentos anti-inflamatórios, antidepressivos, analgésicos e reguladores do sono podem ser úteis para controle dos sintomas, que pode reverter em melhor qualidade de vida.

Recomendações

  • Procure ajuda médica se a sensação de cansaço, fraqueza e desânimo, assim como a dificuldade de manter a concentração e a memória ativa, estiverem atrapalhando sua rotina de vida;
  • Não desconsidere, durante as consultas, sintomas banais, como esquecimentos aparentemente irrelevantes, dores de cabeça que vêm e passam, introdução de novos medicamentos ou manutenção daqueles de uso contínuo prescritos pelo médico;
  • Tente responder objetivamente às perguntas que o médico possa fazer-lhe durante a entrevista. Por exemplo: quando os sintomas começaram? há situações em que eles pioram? o apetite e o sono continuam inalterados? na sua família, há pessoas que apresentam sintomas semelhantes? recentemente ocorreu algum fato novo em sua vida?
  • Lembre-se de que é muito importante a qualidade e precisão das informações fornecidas ao médico durante as consultas. Por isso, descrever os sintomas que vão e retornam, em ciclos, de forma clara e objetiva, pode ajudar a esclarecer o diagnóstico e orientar o tratamento;
  • Não confie na sua memória. Leve por escrito o nome e as doses de qualquer medicamento, vitamina ou suplemento que esteja tomando regular ou periodicamente.

O especialista mais indicado para identificar e tratar a síndrome da fadiga crônica é o reumatologista, que pode indicar especialistas de outras áreas para ajudar a controlar os sintomas.

Cansaço pós-covid: por que fadiga pode durar mais que curso da doença - BBC News Brasil