Segundo especialistas, há uma grande diversidade de rituais e cerimônias praticados pelos mais de 5 mil povos indígenas brasileiros
Em época de seca, na qual Brasília passa meses sem ver chuva, é comum que os moradores da cidade brinquem sobre a necessidade de se fazer uma “dança da chuva”, referindo-se a um ritual comum entre muitos dos povos indígenas brasileiros. Mas o que, realmente, representa essa cerimônia para as populações originárias do país?
Braulina Aurora, antropóloga e indígena do clã Waliperedakenai, explica que a ideia de dança da chuva sofreu, ao longo do tempo, uma grande deturpação, devido à falta de compreensão, o que ajudou para a banalização do ritual. Segundo ela, é comum a “exotização” daquilo que não se conhece.
“Na verdade, são rituais de passagem ou de comemoração pela chegada da temporada de chuvas. Servem para celebrar as flores que vão desabrochar, a troca das folhas das árvores e a reprodução de peixes, entre várias outras coisas. A chegada da chuva é sempre muito bem-vinda, significa tempo de fartura”, pontua.
“Cada povo tem seu calendário ecológico e há uma diferença enorme nos conhecimentos dessa prática para cada clã”, completa Braulina, que integra o povo Baniwa, do Amazonas, e veio para Brasília realizar mestrado em antropologia social. Ela acrescenta que esses rituais não são simples. “Só quem pode realizá-los são pessoas preparadas para isso.”
Relação com a natureza
Segundo o historiador José Inaldo Chaves, professor da Universidade de Brasília (unB), a variedade de rituais é grande, o que é natural, uma vez que há mais de 5 mil povos indígenas no Brasil. “Diferentes povos praticam danças como forma de agradecimento pela prosperidade ou como pedidos dirigidos ao Sagrado para que se reequilibrem e apaziguem as relações com a natureza, notavelmente com os ritmos vitais da água”, explica.
Já as palejanças dos Caiapós, em Roraima, são danças que clamam aos espíritos pela vinda da chuva, especialmente após um longo período de estiagem ou quando esse povo identifica algum desequilíbrio na relação com a Mãe-Terra, o que traz prejuízos não só materiais, mas também espirituais.
“Tais culturas mantêm uma relação genética e muito próxima com as matas, os rios e os animais não humanos. A natureza não é vista apenas como o ‘entorno’ ou ‘recurso natural’, mas como dimensão da própria existência da humanidade. Tal relação costuma ser sagrada, ritualizada e também politizada, pois faz parte de seus cotidianos locais”, completa Chaves.