‘O menino que conhecia o fim da noite’ é a sétima obra para crianças lançada pela jornalista
De economia, a jornalista Míriam Leitão entende bem. Há quem se surpreenda, mas, de literatura infantil, também. Já são sete na carreira. Nos livros infantis, sua paixão desde criança, ela encontra uma válvula de escape para os áridos textos econômicos.
“É como se eu tivesse me dando um pouco de água no meio do deserto. O livro infantil, na minha rotina, é um momento em que eu brinco também. Eu fui uma criança fruto do livro infantil. Era o meu brinquedo favorito, o que eu mais fazia”, conta Míriam
Neste sábado (10), a jornalista e escritora lançou em Brasília “O menino que conhecia o fim da noite”. A obra conta a história de uma família, que se aventura pelas profundezas do Brasil em busca da luz do dia. No caminho, se encantam com a flora e fauna brasileira e se reconectam com os povos indígenas.
Quando os dois filhos eram crianças, Míriam costumava inventar histórias, mas nunca pensou que elas poderiam se transformar em livros. Após a chegada dos netos, ela decidiu que sua imaginação chegaria em outras casas. “Eles são inspiração. Já deram palpites e me ajudaram”, conta.
No entanto, a sua última obra foi inspirada no filho, o também jornalista Vladimir Netto. “Quando tinha 5 anos, ele acordou no meio da noite, com insônia, e falou ‘a noite acabou, eu vi o fim da noite e o clarão vindo atrás’. Escrevi para a minha irmã contando essa história, mas esqueci”, diz Míriam.
Pouco antes da pandemia de Covid-19, a jornalista recebeu a carta de volta e sabia que dali nasceria uma nova história. Aos poucos, ela foi surgindo, em meio à escuridão trazida pela pandemia.
“A noite [do livro] pode ser qualquer paralelo: as noites do Brasil em geral, as noites que a gente vivia quando eu estava grávida dele, a noite que a gente vive hoje”, conta.
Mensagem para os mais velhos
Se engana quem pensa que a literatura infantil é só para os pequenos. Para o leitor atento, as mensagens e lições são absorvidas, não importa a idade. Míriam escutou da também jornalista e escritora Ana Maria Machado que os livros para criança tem mais de um público, apesar de parecer ter apenas um.
“[O livro] tem vários recados para os adultos. Acho que o recado principal é que mesmo noites muito longas acabam”, diz Míriam. Em, “O menino que conhecia o fim da noite”, a jornalista espera ainda apontar a direção da Amazônia para o Brasil, principalmente ao destacar a relação dos brasileiros com os povos indígenas.
“De vez em quando, a gente percebe e os vê. De vez em quando, a gente faz de conta que eles não existem. Essa invisibilidade dos indígenas, sendo eles a solução daquele enigma, é um pouco do recado que eu também quero passar”, afirma.
Amor à natureza
Defensora da natureza, Míriam busca colocar a mão na massa quando o assunto é preservação. “Comprei uma terra em Minas Gerais e replantei 34 mil mudas nativas da Mata Atlântica. Eu estudei bastante aquele bioma e a gente fez um plantio ano a ano, no esforço nosso”, conta.
A ligação com o meio ambiente se transfere para o papel e não é novidade em seus livros. Desde o primeiro, ela narra sobre a importância do cuidado com a natureza. No entanto, a intenção não é ensinar ou convencer as crianças.
“O que eu descobri ao longo dessa minha interação com as crianças é que elas têm uma compreensão muito profunda da importância da proteção ambiental. Não sou eu que estou ensinando. É uma geração já preocupada com a questão ambiental”, afirma. A jornalista evita inclusive, dar nome às palavras e conceitos complexos. Sustentabilidade, meio ambiente e mudanças climáticas, por exemplo, estão presentes na narrativa, mesmo não aparecendo entre os textos.
“Tomo muito cuidado para as palavras dos adultos não penetrarem esse mundo da criança, não quebrarem essa mágica. Quero que permaneça lúdico, mas que elas entendam na dimensão delas”, explica.
Por mais que ensine sem querer, o objetivo mesmo é garantir a aventura. “Eu quero divertir como eu fui, pela literatura infantil, entretida naquele mundo encantado. Acho que naturalmente, por eu não ter essa preocupação, os valores surgem.”
Claro no escuro
Míriam reconhece o desafio que deu à ilustradora Lucia Koranyi. Apesar da história se passar durante uma noite, a alegria não podia deixar de existir nos desenhos. Por fim, a jornalista se surpreendeu com as aquarelas que trouxeram o claro para a escuridão.
Ela acredita que um livro infantil tem três autores: aquele que escreve a história, o ilustrador que completa a narrativa e a editora que celebra o casamento entre os dois. Em “O menino que conhecia o fim da noite”, a história da vida real também teve um final feliz.
“Eu, sinceramente, tive medo de ter dado para o ilustrador uma missão impossível. Mas ela fez uma coisa realmente maravilhosa. Acho que ela conseguiu resolver de maneira magnífica”, destaca.