Ainda em fase de testes, nova droga foi descrita como divisor de águas na missão de criar uma pílula contraceptiva para homens
Uma nova droga foi capaz de imobilizar rápida e temporariamente o esperma de camundongos machos, de acordo com um estudo publicado ontem (14) na Nature Communications. A descoberta, descrita por pesquisadores como um “divisor de águas”, poderia abrir caminho para uma pílula anticoncepcional masculina e, em última análise, permitir que os homens compartilhem igualmente com as mulheres a responsabilidade no controle da natalidade.
Uma única dose oral da droga imobilizou o esperma de camundongos por até duas horas e meia e foi 100% eficaz nas primeiras duas horas, disseram os pesquisadores.
Camundongos tratados mostraram comportamento normal de acasalamento, mas nenhum engravidou um parceiro, apesar de 52 tentativas diferentes de fazê-lo. Para se ter uma ideia de comparação, um terço dos ratos tratados com substância de controle inativa engravida seus parceiros.
A droga é de ação rápida – Melanie Balbach, uma das autoras do estudo e pesquisadora da Weill Cornell Medicine, disse que funcionou em 30 a 60 minutos – e funciona inibindo uma enzima necessária para o funcionamento do esperma. Também é temporária, com eficácia caindo para 91% em três horas e a fertilidade voltando ao normal no dia seguinte.
Essas propriedades diferenciam a droga de muitos dos outros esforços para desenvolver um contraceptivo masculino, que geralmente dependem de hormônios para controlar a fertilidade e podem levar semanas ou meses para serem eficazes ou desaparecerem.
O estudo segue o conceito “contraceptivos masculinos seguros, não hormonais, sob demanda”, disseram os pesquisadores, e, embora possa funcionar em teoria, qualquer produto levará muitos anos e muitos testes no futuro.
Para ficar de olho
A descoberta é um “divisor de águas” na busca pelo desenvolvimento de outra forma de contracepção para homens, disseram Jochen Buck e Lonny Levin, professores de farmacologia da Weill Cornell Medicine e autores seniores do estudo. A dupla lançou sua própria empresa, a Sacyl Pharmaceuticals, para desenvolver anticoncepcionais baseados nos inibidores e disse que o próximo passo será repetir o experimento em um modelo animal diferente. Buck disse que isso “estabeleceria as bases para testes clínicos em humanos” e Levin disse que a equipe já está trabalhando para criar inibidores que seriam “mais adequados para uso em humanos”.
Embora homens e mulheres compartilhem a mesma responsabilidade pelo controle da natalidade, a carga é desproporcionalmente suportada pelas mulheres. Em grande parte, isso ocorre porque são as mulheres cisgênero capazes de engravidar, assim como as pessoas transgênero e não binárias, que arcam com os riscos associados a ela. Há uma infinidade de opções de controle de natalidade disponíveis para mulheres – incluindo injeções hormonais, adesivos, implantes e pílulas, dispositivos intrauterinos (DIUs) e anéis vaginais –, muitos dos quais são acompanhados por uma longa lista de efeitos colaterais potenciais, possivelmente graves.
Enquanto isso, homens cisgênero (e outros pais que não dão à luz) têm duas opções: vasectomia e preservativos. Os cientistas tentaram, sem sucesso, expandir essa lista por décadas e, embora alguns candidatos tenham gerado muito burburinho, nenhum ainda chegou às prateleiras das farmácias. Em parte, isso não é uma prioridade para as empresas farmacêuticas.
Outro problema são os efeitos colaterais associados a alguns contraceptivos farmacêuticos, que interromperam alguns ensaios recentes por possivelmente oferecerem risco para os participantes, apesar de serem comuns a muitos contraceptivos femininos já existentes no mercado. Levin disse que há um limite maior de segurança e efeitos colaterais para possíveis contraceptivos masculinos porque se presume que os homens, que não correm os riscos associados à gravidez, terão uma tolerância menor do que as mulheres.
Fato surpreendente
Quase metade das gestações em todo o mundo são indesejadas, cerca de 121 milhões a cada ano, de acordo com o Fundo de População das Nações Unidas. Em muitos casos, mulheres e meninas não têm controle sobre a possibilidade de engravidar. Isso se deve a questões como violência e coerção sexual, desigualdade de gênero, educação e falta de métodos contraceptivos.